sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A arte de receber amigos


Como há um tempo para tudo, de repente chega a hora de uma comemoração e decidimos que queremos os amigos em casa, fazendo festa. Marca -se o dia, avisamos todo mundo e começam os preparativos _ são amigas e amigos tão queridos que tudo tem que ser muito bem feito porque eles merecem o melhor possível.

Primeiro vem o planejamento, a hora do sonho e das melhores intenções: aquela receita nova e maravilhosa que vimos na TV ou degustamos por aí e, segundo conta a lenda é 'facílima e não tem como errar'; a mesa maravilhosa, toalhas de linho engomadas, guardanapos dobrados como obras primas do origami; um texto - superlativo - que demonstre do fundo do coração o apreço que temos pelos nossos convidados; as bebidas quentinhas se o tempo esfriar e adequadamente resfriadas se o calor for de abafar; a casa cheirosa e arrumada como em revista de decoração!  

Assim a festa vai se constelando e fazendo parte do dia a dia, que insiste em não deixar tempo de sobra para que nos ocupemos só dos preparativos e... eis que chega a hora de fazer a festa. 
Dias antes, en passant, damos uma passada de olhos pela casa e dá vontade de mudar: de casa (direto para aquela página da revista que a gente guarda como a casa perfeita dos meus sonhos), de diarista (e ter aquela organizadora do programa da TV americana, de graça e todo dia arrumando as coisas por aqui) ou pelo menos de hábitos e traçamos o firme propósito de não deixar acumular sequer um simples papelzinho ao lado do telefone ou uma poeirinha na prateleira. Mas agora, só resta um esforço concentrado prá manter a auto estima, porque afinal: "su casa, su cara" e, lá vamos nós na faxina!

Depois, às compras: confeitarias (onde é mesmo que colocamos o telefone de quem prepara "o quê mesmo que alguém - quem ?- recomendou, que era uma delícia?"); supermercado, açougue, frutaria; papelaria... anota tudo, sai correndo e deixa as anotações em cima da mesa da cozinha, esquece o que era essencial e compra o que não vai usar.

Véspera, dia 'D' (decisivo) forno e fogão: na metade do assado (depois de perceber que a encomenda veio trocada, o que era para ser 'lombo', virou 'pernil com osso', mas pelo menos o peso coincide) o gás acaba.... tudo bem, nada de estresse! A tal receita facílima não dá as dicas certas e a coisa fica assim 'meio coisa', ainda que o gosto seja bom. A pia da cozinha vira uma pirâmide e o que a gente mais precisa está sempre por baixo - o que leva a lavar tudo de quinze em quinze minutos. Mas não faz mal, afinal queremos dar o nosso melhor às pessoas querida.  
A geladeira transforma-se num mistério digno de Sherlock Holmes: o espaço interno que há pouco era enorme, some; as prateleiras encolhem, o freezer vira uma caixinha de gelo e você, descaradamente, apela: _"Meu Deus, onde vou colocar as coisas prá gelar?" Tira daqui para lá, reloca, joga fora, ao final dá-se um jeito. 

E chega o dia da festa. A faina começa cedo: as toalhas, mesmo passadas e repassadas a ferro perdem o encanto; as dobraduras dos guardanapos (um mes antes pesquisadas por horas na Internet) foram esquecidas e alí estão eles, plácidos em sua embalagem fechadinha ("ih! esqueci!!"); as mesas alongadas e desdobtradas, teimam em não ter elegância nenhuma quando as cadeiras (próprias e emprestadas) são a elas anexadas _ nada combina, nem em tamanho quanto menos em estilo. Pelo menos a louça e os talheres se parecem (fomos espertas, minha irmã e eu quando compramos jogos de louça semelhantes!!). Apesar de tudo, a casa está 'um brinco' e a sala acolhedora ("é o que temos por hoje, senhoras!"). Na cozinha louvamos todos os confeiteiros do  mundo que ganham seu santo sustento fazendo e vendendo suas delícias (e, maravilha das maravilhas, entregam os quitutes em casa na hora combinada) e só nos resta desculparmos pela cara daquele docinho feito em casa 'com a melhor daas intenções'. 
 
E então, acontece o milagre - as amigas chegam, cheias de abraços, sorrisos, flores, presentes, carinhos, alegria! Cheias de "que lindo!"; "que maravilha!"; "que gostoso!"; "quanto tempo!"; "que saudades!"; "como é bom estar aqui!"  _ a festa se faz, uma corrente luminosa se cria e abençoa cada um num abraço comum e caloroso. Estamos juntos e felizes, somos amigos!

E tudo faz sentido, e tudo vale a pena _ se eu precisar começar outra festa amanhã mesmo, farei tudo do mesmo jeito. Podem contar comigo, sempre!
Obrigada minhas amigas e amigos por virem à minha festa!

Namastê

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A serenidade dos anos que passam


A época do aniversário é marcada por muitos abraços, mensagens de carinho, sorrisos, visitas _ feliz daquele que tem amigos para compartilhar e celebrar os momentos da vida. Fazer dezoito é a glória completa, mas e sessenta?! Bom, aí depende.

Eu, graças a Deus,cheguei aqui muito bem, obrigada. Se comparar com uns (e as pessoas têm mania de comparar) meu caminho foi muito fácil; se comparar com outros, foi bem difícil. Vivo igual aos meus iguais. Se pudesse viver novamente – como pensou o poeta – faria algumas coisas do mesmo jeito, outras absolutamente diferentes: talvez, quem sabe, pensasse menos e corresse mais pelos campos e pelas praias? O que eu sei agora é que não poderia, nunca, trair a minha essência – e quantas vezes teimei assim em fazer em meus anos de juventude!
 
O tempo é um rio por onde seguem as correntes da vida. E nele navegamos ao sabor dos acontecimentos.  O imprevisível nos espreita a cada curva e, por mais que tentemos, não temos como nos preparar para antever o que virá porque toda nossa capacidade está enredada na realidade e ela está acontecendo simultânea, quer dizer, agora e só neste momento. Se eu me descuido do ‘aqui’ para pensar no ‘logo ali’, inevitavelmente, perco o momento. Ah! Quantos neurônios eu queimei desnecessariamente _ aos vinte, aos trinta, aos quarenta _ querendo estar lá no futuro para garantir segurança. 

Quem navega sabe que não pode ter um pé em cada barco _ são os dois no mesmo barco e gingando o corpo para não perder o equilíbrio. Um valioso segredo é aprender que "não sou eu que me navego, quem me navega é o mar"!

Fazer sessenta anos é se aproximar da velhice – no senso comum, ou seja, na moda atual, esta é uma questão tabu, tanto assim que se criaram novos termos para caracterizar esta fase: ‘terceira idade’, ‘melhor idade’, ‘idade de ouro’, ‘envelhescência’, e por ai. Bom para garantir alguns direitos duramente conquistados (afinal trabalhamos muito tempo e já pagamos muito impostos por eles). Ruim, quando a mesma moda quer nos fazer acreditar que estamos à margem ‘do mundo’ se não consumirmos o que a sociedade determina impondo um ‘modus vivendi’ que, muitas vezes, fere a dignidade das pessoas que engordaram, que têm nos pés e nos joelhos o peso dos anos, nas faces as marcas do que viveram. Com o passar dos anos a gente entende porque beleza, verdadeira, é interior. A pele seca, mas a alma pode ser sempre fresca.  

É inerente ao ser humano a capacidade de paz interior e sabedoria – é o que o bebê expressa quando se aconchega no colo amoroso e repousa (ele “sabe”, portanto, confia). Não perdemos esta capacidade, apenas nos esquecemos depraticá-la. E é o esquecer desta graça que traz tristeza ao envelhecer.  
Todos os acontecimentos e experiências são como atribuições e testes pelos quais vamos aprendendo o que é a vida. 
O envelhecimento é o cadinho onde vamos refinar o desenrolar dos eventos da vida como significativos para um propósito maior. É agora que conseguimos entender o ‘quê’, ‘o como’ e o ‘porque’ das coisas vividas. E desta compreensão vem a sabedoria _ com ela cessam os discursos, por isso os velhos se calam; com ela diminui a procura, por isso eles não precisam ir tão longe; os conceitos, idéias e opiniões já pouco valem quando se aprendeu  que o que  realmente importa é o amor e o afeto: por isso os velhos não brigam. Um velho livro, bem  cuidado e preservado é um tesouro porque guarda a sabedoria de outros tempos. 

É por isso que eu peço: Senhor, conceda-me a graça de envelhecer tornando mais puro o que me vier às mãos!
Namastê

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Bom dia Serenidade

Bom Dia Serenidade

Começo hoje a postar em novo blog.

O título, ainda que sem nenhuma pretensão literária, evoca “Bonjour Tristesse” primeiro e famoso livro de Françoise Sagan, escrito aos 18 anos e lançado na França em 1954. Em Bonjour... Françoise conta as experiências de Cecile uma adolescente de 17 anos, em férias de verão com seu pai viúvo e suas ‘amigas’. Cecile jovem, Cecile aprendendo o mundo europeu de pós guerra... Cecile começa sua vida adulta. Cecile, inevitavelmente, vai sofrer de ‘tristesse’ para aprender a viver.

Mas meu blog, de tristesse quer ser antítese _ por isso serenidade, porque eu já vivi muito além dos meus 17!

Para iniciar escolho este mês, outubro, porque nele passo pelo portal e viro sessentona, com orgulho e dignidade.

Convenciona-se que um blog tenha o perfil do responsável. Então:

Fisicamente eu diria que o nariz é grande demais para meu gosto, as costas se curvaram um pouco à medida que coloquei nos ombros pesos que não consegui suportar. A face tem sulcos _ profundos _ que ficaram das memórias dos abismos que transpus. O corpo guarda cicatrizes de ferimentos de batalhas que venci; a cintura se avolumou mesclando-se às ilhargas; o fôlego é mais curto nas caminhadas (mas nunca o tive muito forte mesmo) e, sinceramente, não há um único dia em que pelo menos alguma coisinha não doa. Minha visão é curta e turva, reclamo de minhas lentes, mas como diria o sábio:”reclamei das velhas lentes e ao meu lado estava um cego”

A mente é irrequieta como aos 20 e poucos anos. Às vezes sinto ter dentro da cabeça um parque de diversões onde os pensamentos se desgovernam em imensos tobogãs de água, mas já não bato portas nem me empenho em mudar ninguém _ é claro que quero muitas coisas e com as coisas que quero e não tenho vem junto a ansiedade que não raro me tira o sono... mas a gente vai levando!

Hoje aceito a vida como ela é (ou pelo menos vivo tentando viver assim). Porque tenho a alma confiante, sou filha de Deus, irmã do mundo, cidadã do universo. E é nesta fé que repousa a serenidade que pretendo compartilhar. Aviso que não tenho igreja, mas sei reconhecer um altar quando o sinto _ uma flor, uma árvore, uma criança, um sorriso, um abraço, uma palavra, uma pessoa, um gesto, um dia de chuva, um céu azul, o mar, uma montanha, um bom bocado, um gole de água pura, o pão ou o vinho _ e nele me curvo e faço minhas preces.

Conheço a tristesse porque muito vivi e aprendi que o cinza tem inúmeras tonalidades, mas descobri que a paleta da alma é mágica e azuis turquesa, verdes berilo, rosas chá e amarelos citrino têm o poder de transformar o cinza em brilho de prata.

Há muito tempo viajo pelo interior dos meus reinos, conheço as geografias e os dialetos. Sei onde mora o sonho e a coragem. Sei onde a paciência tece seu inacabável manto, onde a compaixão recolhe as dores alheias, onde o preconceito se esconde, onde a fofoca tagarela suas pequenas maledicências, onde a preguiça empurra o lixo para o quintal do vizinho. Sei onde o carinho toca uma mão, onde o amor põe no berço uma criança. Sei um pouco das coisas simples e fundamentais da vida

É do conhecimento destas coisas que quero falar o que sinto _ não são “verdades da vida”, mas são as minhas aprendizagens, os relatos das minhas viagens pela alma, pelos caminhos que aprendi serem bonitos porque contém o divino, o intocável de cada um de meus semelhantes.

Namastê minha irmã, meu irmão.

Com amor, Ana